o amor segundo buenos aires
- ela se alimenta da dedicação dele
- me permiti admitir, silenciosamente, que nao faz mal nenhum ter alguém a seu lado para ajudar em tarefas que voce é capaz de fazer sozinho
- mas o fato é que eu entendo buenos aires como não entendo nenhum outro lugar no mundo. e acho que buenos aires também me entende
- daniel tem uma capacidade rara hoje em dia: faz uma coisa de cada vez. o que esta fazendo, daniel? branqueando o colarinho das camisetas. cortando a cebola para o omelete de domingo de manhã. passando a roupa. comprando comida. ouvindo rádio. ele nunca está a caminho de fazer alguma coisa
- com dani é preciso ter paciência de deixar a informação vir aos poucos. tento me controlar para não perguntar demais. conviver com ele me faz resistir à tentação de discutir e esmiuçar tudo o que se pensa e se sente
- daniel me emocionava
- mas os cálculos feitos e refeitos sentado na sala de seu minúsculo apartamento estavam corretos
- ainda não é a hora. eu vou saber o momento. ainda nao é a hora
- à medida que o mundo de cada um evolui, a saída é buscar pessoas que constribuam para explandi-lo
- o senso prático de edu, sua mente de arquiteto, ajudou a transformar o tratamento em um jogo matemático, uma etapa de um videogame mórbido a ser vencida a qualquer custo
- quando a vida nao oferece muito, a tendência é não pedir nada
- a viagem, lá no fundo, é uma maneira de se desligar do tempo, parar de contá-lo
o despertar de leões
- temos que esperar que alguma coisa deja destruída para compreender o que estava funcionando bem antes disso. este é essencialmente o método mais básico na pesquisa do cérebro: nao se pode simplesmente desmontar o cérebro das pessoas e verificar o que acontece, é preciso esperar que o acaso faça isso por voce
- como nao se lembrava de todas as vezes em que pulara da árvore no quintal e na terra o recebera com boas vindas, e sim daquela única vez em que se estatelara e quebrara uma perna
- todos devem sua existência à premissa de que o que havia é o que haverá
- no estreito espaço entre os lábios, um mundo inteiro
- quando se é a única pessoa que sabe alguma coisa, essa coisa existe menos
- mentiu para que Liat nao soubesse quao longe esta do homem que ela pensa que ele e. mas ao mentir só se afastou daquele homem, afastou-se dele cada vez mais, ate que no fim nao via ali senao uma caricatura
- entao, a maior parte do tempo preferia pensar que vagava pelo mundo sem cor de pele e sem família, sem lugar de origem e sem comunidade
- quando ficava diante do espelho, ela desejava que seu corpo engolisse de volta as vergonhosas protuberâncias, que simplesmente fossem de novo assimiladas pela carne, que ate alguns meses antes era admiravelmente achatada
- os homens são capazes de pôr os olhos em você como põem uma coleira no pescoço de um cão
- eles a fitavam quando se aproximava e fantasiavam com ela quando se afastava, mas de maneira alguma a viam. apenas a carregavam cim seu desejo, como se amarram botijas de água ao dorso de um burro
- se era culpada de algo, nao era pelo desejo, e sim por tudo o que nao desejara antes
- nao sabem que o banimento que ela mesma se impôs é inverso. eles a banem pelo desejo, ela se bane pela ausência dele
- faz quarenta e um anos que ele caminha nesse corpo, pensando que o conhece
- pois o amor sempre cobiça tambem o passado que o antecedeu
- com a mão no coração, ela ainda ama seu homem. e ele a ama. tudo isso é absolutamente certo, mas nao anula aquela medida de alheamento que existe ate mesmo no lugar que mais se conhece
- tremendo de humilhação e de raiva, dirigiu-se a eitan. "para cada pancada que assum lhe dava, alá vai dar dez"
- ela tinha se escondido da vida
- o rosto de uma mulher que foi moldado a uma temperatura de quarenta e cinco graus à sombra e lavado numa precipitação média de onze milímetros de chuva por ano
we set the dark on fire
- e se nunca houvesse um depois? e se elas nunca tivessem a chance de estar prontas?
- sua pele derretendo do marrom profundo de dani ao tom dourado de carmen
- se quisermos lutar temos que encontrar alegria onde pudermos
- acorda, mi amor — ela disse, beijando a bochecha de carmen. — tudo mudou
- pense nos crimes que nosso governa tolera, nao apenas nos que ele pune
- o treinamento de Primeira reduziu a memória a um sussurro silencioso em seus ossos
- tempestade sem olhos
- como se eles fossem sao decididamente outros que mesmo um olhar para um os revelaria pelo que realmente eram
- cem tons de uma garota
- mesmo com os olhos fechados, as curvas de carmen puxaram a maré do seu rubor como uma lua de mel
- guardar sua retaliação para quando for fazer algo a mais do que apenas arruiná-la
- ela pensou em mateo,e em como nenhuma quantidade de privilégio ou segurança valia a pena deixa-lo vencer
- a maneira com que ela olhou para cima através de seus cílios venceu, ela poderia ter pedido qualquer coisa
- dani se imaginou pegando a mão de carmen. andando de braços dados
- mas eu deixei suas sonhos pra mim se tornarem eu
- o passado pode nos confortar mas nao pode nos alimentar
é assim que começa - colleen hoover
- eu não o salvei, tudo o que fiz foi me apaixonar por ele
- pra mim não faz diferença se você mudou, Ryle. eu espero que tenha mudado mas não cabe a mim testar essa teoria
- vai dirigir oito quilômetros só para me abraçar? - eu correria oito quilômetros só para te abraçar
- nao tem nada melhor do que saber que, agora, é comigo que voce vai ser feliz
- seu abraço parece uma conversa inteira
pequena coreografia do adeus
- você é o meu corpo e nós estamos juntos nessa
- minha mãe ele abandonou de uma vez, mas comigo é pior, ele fica me abandonando devagar
- será que eu nao amava mais a minha mãe?
- pensando que compreenderia algo importante sobre a vida ao me cobrir, me fechar exatamente como a senhora tem feito com a casa quando há qualquer vestígio de Luz
- me Assombrava a certeza de que as pessoas se abandonam
- é uma pena que a maioria das nossas avós vão embora antes de virarmos pessoas que sabem aproveitar uma conversa
- a dona Vera nunca soube como se levantar do que acontecia
- era quase melhor falar com a folha que apenas escutava silenciosa, mas atenta quente e sempre receptiva à minha dor.
- eu só queria ter um pai que nao fosse eternamente o homem que deixou a minha mãe
- eu só precisava cansar a minha cabeça
- alegrias de talco
- eu era o lugar onde as pessoas depositavam as suas variações de tristeza e raiva sem medo algum de depositar, já que eu aparentava a mais pura fragilidade, o rosto coberto pelo espanto de existir
- eu era controlável, contornável
- eu queria entregar na dança o m e d o que sinto, deixar que ele se espalha e se perca
- a aura da Madame emanava um certo tom metafísico que despertava em mim o Desejo de Ser a menina dos seus olhos
- digam Mais, me contem tudo sobre mim
- fechei a porta, ganhei a rua
- agora eu sou dona do meu tempo e do meu corpo todos os meus desejos assolavam o meu espírito, a grande festa, 'você precisa olhar pra gente agora' Sim, eu sei
- depois que saí de casa, sinto que o novo lugar favorito da minha mãe é no Passado, o dia de hoje serve apenas de apoio para os pés enquanto o resto do corpo nao para de lembrar e lembrar
- impressionantemente, o medo nao é nosso estado natural
- pensei, enquanto secava os copos, que nunca carreguei essa explosão de energia no corpo, deve ser porque eu nunca tive uma turma e algumas forças a gente só exerce quando está em grupo
- mas entre mim e a minha mãe existe uma diferença brutal, que é a culpa
- quantas possibilidades de júlia eu perdi pelo caminho para me transformar nessa júlia que sou agora?
- paris é uma cidade cheia de vida, ela me tira pra dançar o tempo todo
- tanto silêncio assim em uma pessoa não está certo
- até o alívio se transformaria em dor
- toda gente só queria mesmo suspender o tempo
os abismos
- sempre pensei que a selva eram os mortos da minha mãe. seus mortos renascidos
- sentiu, ela me disse, que alguém lhe abria o peito, enfiava a mão lá dentro e arrancava seu coração
- quando a tristeza entra no meu corpo eu tento manda-la embora, eu juro
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- cáli, partida por um rio com curvas e pedras, as ruas mortas, os prédios baixos em meio a arvores que os ultrapassavam, parecia uma cidade perdida
- (que pensamentos?) que o marido sa minha tia cheira mal e mora na rua. que o meu pai no fundo é uma pessoa ruim. que a minha mãe nao tem rinite, mas preguiça
- você não pediu ajuda à sua mãe. Olhei para ela surpresa. — Não é verdade? Seus olhos eram cor de café, muito escuros, e a parte branca estava mais para amarela. Olhei para a turma. Minhas colegas, nas suas carteiras, esperavam uma resposta. — É verdade — disse, porque preferia que pensassem que a tosca que havia feito aquela coisa horrível era eu
- então o abismo, como não conseguia fazer com que eu me atirasse nem podia me devorar, entrava pelos meus olhos, uma coisa deliciosa e horrível, uma bolinha saltitante na barriga e uma náusea asquerosa e pestilenta, até ficar bem enterrado em mim
- naquela noite o sono não me bateu com força nem conseguiu me afundar nas profundezas, onde tudo é macio e a gente se perde do mundo, mas me deixou em um limbo, que era como dormir acordada, presa a um espaço minúsculo entre as pálpebras fechadas e os olhos
assombrações - domenico starnone
- toda a minha infância, toda a adolescência haviam sido um esforço permanente para achar um jeito de quebrar a corrente da descendencia. queria individualizar um traço meu, só meu, que me permitisse me desvencilhar do sangue dele
- a energia visioria do menino entorpecia a minha, me deprimia, deixando minhas palpebras pesadas
- dali a duas decadas, por comodismo, poria em surdina grande parte de si - uma area vasta, a ser despojada aos poucos - e correria atrás de alguma miragem que depois chamaria de meu destino
- fazia uma coisa, pensava noutra, a vida evaporava
- mas já vivi tempos pelo menos tao ruins quanto os de hoje e nunca me aconteceu de abrir os olhos de manhã e ter medo de saber por quê. algo em mim se deteriorou. talvez esteja se exaurindo a certeza de saber reagir a qualquer acontecimento
- quando adoeceu, tornou-se sombria, e só então percebi que nunca me contara nada que fosse intimamente seu. fingia nao ter uma vida interior
- como se desenham os sons?
- a ambição desmensurada se mantém em surdina, tem vergonha de si. mas em segredo as hierarquias fixadas pelo mundo lhe parecem duvidosas, sua pretensão é tamanha que nao sabe se sujeitar a nenhum modelo, a nenhuma afinidade, aliás, até aquilo que admira, o admira apenas para supera-lo
- agarrando-se às mil possiveis variações da cidade, porque também a matéria de Nápoles é variável, tantas, tantas cidades podiam existir nela
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