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Trechos de obras literárias, bem como de livros acadêmicos. Todos eles, porém, estão aqui por conterem um significado pessoal, seja pela ressonância de alguma ideia ou sentimento, seja pelo apreço estético. De algumas obras, destaco mais de uma citação. Como não registrei números de páginas, preferi manter o ano de publicação das primeiras edições, sempre que possível.

❧ Existe um êxtase que assinala a plenitude da vida e para além do qual a vida cessa. E, tal é o paradoxo do viver, esse arrebatamento que chega quando estamos mais vivos surge com o esquecimento de que estamos vivos. Esse êxtase, esse esquecimento da vida, conhece-o o artista arrebatado e fora de si numa língua de fogo; conhece-o o soldado no campo da derrota quando, de cabeça perdida, não se rende; e conhecia-o Buck, nesse momento, na frente da matilha, soltando o velho grito dos lobos, correndo, correndo, tenso, atrás do alimento ainda vivo que se esgueirava, velocíssimo, como através do luar. Ressoavam nele as profundezas da sua natureza e das partes da sua natureza que eram mais profundas do que ele e recuavam até às entranhas do Tempo. Possuía-o o puro borbulhar da vida, a maré do ser, a alegria perfeita de cada músculo, cada articulação, cada tendão, tudo o que não estava morto, mas vivo e palpitante, exprimindo-se em movimento, voando triunfalmente sob as estrelas, face à matéria morta e sem movimento. -- Jack London, O Apelo da Selva, 1903.

❧ Ao morrer, como quando a cena está fixada no rolo do filme e os cenários foram derrubados e queimados, somos fantasmas nas lembranças que nossos descendentes guardam de nós. Então somos fantasmas, querido, somos mito. Mas ainda estamos juntos, ainda somos um passado comum, um passado distante, é o que somos. Debaixo de um relógio de passado mítico ainda ouço a sua voz. -- Jostein Gaarder, Maya, 1999.

❧ "Sabíamos que o fim estava próximo, por isso pusemos tudo num poema, para contar ao universo quem éramos, por que estávamos aqui e o que dizíamos, fazíamos, pensávamos, sonhávamos, desejávamos. Embrulhamos nossos sonhos em palavras e moldamos as palavras para que vivessem para sempre, inesquecíveis. Depois, enviamos o poema como um padrão de fluxo, para aguardar no coração de uma estrela, emitindo sua mensagem em pulsos, erupções e chiados por todo o espectro eletromagnético, até que, em mundos a mil sistemas solares dali, o padrão fosse decodificado e lido, e se tornasse um poema de novo". / "E aí o que aconteceu?" Ela me olhou com seus olhos verdes, e foi como se ela estivesse me olhando através de sua meia máscara de Antígona, mas como se aqueles olhos verde-claros fossem apenas uma parte diferente, mais profunda, da máscara. / "É impossível ouvir um poema sem que ele mude você", observou ela. "Eles o ouviram, e o poema os colonizou, tomou posse deles, e os habitou. Os ritmos do poema passaram a fazer parte do modo de pensar deles. Suas imagens transformaram para sempre as metáforas deles. Seus versos, seu modo de ver, suas aspirações se tornaram a vida deles. Depois de uma geração, as crianças já nasciam sabendo o poema, e logo, porque essas coisas são assim, já não nasciam mais crianças. Não havia necessidade delas, não mais. Só havia um poema feito carne que andava e proliferava por toda a vastidão do conhecido". -- Neil Gaiman, Coisas Frágeis, 2006.

❧ Segundo as tradições dos achilpa, uma tribo Arunta, o Ser divino Numbakula "cosmizou", nos tempos míticos, o futuro território da tribo, criou seu Antepassado e fundou suas instituições. Do tronco de uma árvore da goma, Numbakula moldou o poste sagrado (kauwa-auwa) e, depois de o ter ungido com sangue, trepou por ele e desapareceu no Céu. Esse poste representa um eixo cósmico, pois foi à volta dele que o território se tornou habitável, transformou-se num 'mundo'. Daí a importância do papel ritual do poste sagrado: durante suas peregrinações, os achilpa transportam-no sempre consigo e escolhem a direção que devem seguir conforme a inclinação do poste. Isto permite que os achilpa, embora se desloquem continuamente, estejam sempre no 'seu mundo' e, ao mesmo tempo, em comunicação com o Céu, onde Numbakula desapareceu. Se o poste se quebra, é a catástrofe; é de certa maneira o 'fim do Mundo', a regressão ao Caos. Contam Spencer e Gillen que, tendo-se quebrado uma vez o poste sagrado, toda a tribo foi tomada de angústia; seus membros vaguearam durante algum tempo e finalmente sentaram-se no chão e deixaram-se morrer. -- Mircea Eliade, O Sagrado e o Profano, 1959.

❧ Mas o tigre que vemos perambulando nervosamente pela cela na verdade se dedica a algo que um humano reconheceria como um pensamento. E esse pensamento é uma pergunta: Por quê? "Por quê, por quê, por quê, por quê, por quê, por quê?", o tigre se pergunta hora após hora, dia após dia, ano após ano, ao repisar seu infindável trajeto atrás das barras da cela. Ele não pode analisar a pergunta nem ampliá-la. Se fosse possível perguntar à criatura: "Por que o quê?", ele não seria capaz de responder. No entanto, a pergunta queima como chama inextinguível em sua mente, causando uma dor lacerante que só se aplaca quando a criatura entra numa letargia final, que os técnicos reconhecem como uma rejeição irreversível da vida. É claro, esse interrogar é algo que o tigre não faz em seu habitat. -- Daniel Quinn, Ismael, 1992.

❧ Dentro de seis meses lhe nasceria o bebê. Algo que tinha sido uma célula única, um grupo de células, um saquinho de tecidos, uma espécie de verme, um peixe em potência, com guelras, agitava-se-lhe no ventre e um dia viria a ser um homem - homem adulto, que sofre e goza, que ama e odeia, que pensa, que recorda, que imagina. E o que tinha sido uma ampola gelatinosa dentro de seu corpo inventaria mais tarde um deus e o adoraria; o que tinha sido uma espécie de peixe haveria de criar e, tendo criado, se transformaria num campo de batalha entre o bem e o mal; o que tinha vivido nas trevas dentro dela, como um verme parasita, haveria de olhar para as estrelas, escutar música e ler poesia. Uma coisa se transformaria numa pessoa, uma massa minúscula de matéria se converteria num corpo humano, num humano espírito. O maravilhoso processo da criação progredia nas suas entranhas, mas Marjorie só tinha consciência da doença e lassitude; o mistério para ela nada significava senão fadiga, fealdade e um ansiedade crônica com relação ao futuro: era a tortura do espírito aliada ao mal-estar do corpo. -- Aldous Huxley, Contraponto, 1928.

❧ Isto é pra quando você vier e sentir o temor de continuar procurando, mesmo já tendo ido longe demais. Ele deve ter lhe falado dos portos que visitou, do que viu pelo mundo, sempre um pouco mais além numa busca sem fim e circular; e do que trouxe para casa, não os objetos que passaram a assombrar a mãe depois da sua morte, mas o que lhe marcou os olhos para sempre, deixando-lhe aquela expressão que ele tentava disfarçar em vão e que eu apreendi quando chegou a Carolina na distração do seu cansaço, os olhos que traziam o que ele tinha visto pelo mundo, a morte de um ladrão a chibatadas numa cidade da Arábia, o terror de um menino operado pelo próprio pai, a entrega dos que lhe pediam que os levasse com ele, para onde quer que fosse, como se dele esperassem a salvação. Ele me disse que ninguém pode imaginar a tristeza e o horror de ser tomado como salvação por quem prefere se entregar sem defesas ao primeiro que aparece, quem sabe um predador, a ter que continuar onde está. E eu imaginei. Ao contrário de você, a única coisa que ainda me pergunto é sobre o momento em que ele entendeu que estava perdido, quando passou a sentir que alguém pudesse ver nele a salvação, o momento em que entendeu que tudo podia ser ainda muito pior e que havia gente abaixo dele na sua escala de aviltamento. Porque talvez tenha sido esse o instante em que ele decidiu que desceria também, sempre um pouco mais, nem que fosse para lhes dar a mão. E quando precisou que eu lhe estendesse a minha, já não estava ao meu alcance. Penso em como são formadas as personalidades peculiares. Se são como as outras, se são como nós. O que pode ter passado um homem na infância para trazer uma cicatriz daquelas na barriga? Que espécie de sofrimento o pôs em sintonia com um mundo pior que o seu? -- Bernardo Carvalho, Nove Noites, 2002.

❧ Eis aqui, pois, a minha história. Eu a reli. Ela contém fragmentos de medula - e sangue, e belas e brilhantes moscas azuis. Neste ou naquele de seus volteios sinto que o meu escorregadio 'eu' me foge, deslizando para águas mais profundas e negras do que aquelas que me interessa perscrutar. -- Vladimir Nabokov, Lolita, 1955.

❧ Se eu ajudo a matar a todas as formas organizadas da vida religiosa, não é para destruir um sentimento, mas para abolir as disciplinas e as morais, para revincular os ritos atuais às superstições secretas, os dogmas de hoje aos ensinamentos de iniciados, as religiões às magias, para fazer das suas santas as fadas de amanhã, e dos seus padres os mais estranhos bruxos dos cultos proibidos. Que fantástico magnífico nós vamos realizar para assombrar os pesadelos das crianças e povoar a imaginação das velhinhas do ano 3000! Já que as velhas religiões das florestas, das plantas e dos animais sagrados, que se perpetuavam em magias deslumbrantes, acabaram afinal morrendo, vamos fazer da sua cristianização uma magia inédita. Numa ensurdecedora usina de todas as máquinas, com pressa de cumprir as suas tarefas mecânicas, operários assustados em meio à fuga das correias, da obstinação das bielas, da velocidade das rodas cintilantes, passarão uns aos outros fragmentos de salmos ou de oração dominical, feito senhas para encontros em pedreiras abandonadas, onde uma mulher vestida de sobrepelizes sacerdotais irá ensaiar gestos desconhecidos, pronunciar palavras vazias diante dos olhares angustiados que não entenderão nada. Tocarão nos mortos com um braço quebrado da Virgem Maria para tentar revivê-los, e essa fantasmagoria toda se mesclará aos últimos conhecimentos, às trações elétricas, aos curativos químicos, numa síntese que para os nossos tatarasobrinhos decerto não irá carecer de sabor. Casulas encontradas num baú antigo, num sótão, diante do qual irão interminavelmente sonhar crianças de frontes demasiado vastas, cabeças demasiado pesadas, e que irão reensinar, a esses pequenos seres recheados de ciência e números, a perturbação da poesia, a sedução do mistério. Cruzes de cobre e de ferro, ontem símbolos da religião do sol, hoje transformadas em símbolos da remissão dos pecados, o que significarão vocês nesses anos futuros para as consciências atormentadas à cata de um pouco de desconhecido e estranheza? Já não haverá Igrejas cristãs: haverá apenas a do cristianismo. Desejo que ela encante os meus descendentes como os meus verdes anos se encantaram com velhas sobrevivências arianas... -- Roger Bastide, O Sagrado Selvagem e Outros Ensaios, 1975.

❧ Algumas vezes eu imaginava o sangue enchendo um copo descartável. Eu podia escutar cada esguicho batendo contra as paredes enceradas do copo. Talvez 100 esguichos enchessem o copo; seriam apenas 50 segundos. Então eu pensava em como poderia cortar meus pulsos. A faca da cozinha? Aquela pequena e afiada, com o cabo preto? Ou uma lâmina de barbear? Mas não existem mais lâminas de barbear cortantes; somente aquelas lâminas injetadas, que são seguras. Eu nunca havia percebido o desaparecimento da lâmina de barbear. Acho que é assim que eu, também, desaparecerei. Sem estardalhaço. Talvez alguém vá pensar em mim em algum momento de fantasia, exatamente como pensei na extinta lâmina de barbear. Contudo, a lâmina não está extinta. Graças aos meus pensamentos, ela ainda vive. Sabe, não existe mais nenhuma pessoa viva, agora, que era adulta quando eu era criança. De modo que eu, como criança, estou morto. Em algum dia próximo, talvez em quarenta anos, não existirá mais ninguém vivo que tenha algum dia me conhecido. É quando estarei verdadeiramente morto, quando não existir na memória de ninguém. Eu pensei muito sobre uma pessoa muito velha, o último indivíduo vivo que conheceu alguém ou um grupo de pessoas. Quando essa pessoa velha morre, todo o grupo morre também, desaparece da memória viva. Eu gostaria de saber quem será essa pessoa para mim. A morte de quem me tornará verdadeiramente morto? -- Irvin D. Yalom, O Carrasco do Amor, 1989.

❧ — Ah! — suspirou o outro. — Mas a arrogância e a tolice permitirão que Adão sobreviva até a maturidade? Acreditando ser nosso igual, será capaz de tudo. Em sua arrogância, será capaz de olhar para o jardim ao redor e dizer: 'Está tudo errado. Por que tenho de repartir o fogo da vida com todas essas criaturas? Vejam como os leões, os lobos e as raposas ficam com a caça que poderia ser minha. Isso é mau. Matarei todas essas criaturas, e isso será bom. E vejam como os coelhos, os gafanhotos e os pardais ficam com os frutos da terra que poderiam ser meus. Isso é mau. Matarei todas essas criaturas, e isso será bom. E vejam como os deuses impuseram um limite para meu crescimento, assim como impuseram um limite para o crescimento de todos os outros. Isso é mau. Crescerei sem limites, tomando para mim todo o fogo da vida que alimenta o jardim, e isso será bom'. Digam-me, se fosse assim, quanto tempo Adão viveria antes de devorar o mundo inteiro? / — Se fosse assim — responderam os outros — , Adão devoraria o mundo num único dia e, no final desse dia, devoraria a si mesmo. / — Precisamente — acrescentou o outro — , a não ser que conseguisse escapar deste mundo. Então devoraria todo o universo, assim como devorou o mundo. Mas, mesmo assim, acabaria inevitavelmente devorando a si mesmo, como ocorre a todos os que crescem sem limites. / — De fato seria um fim terrível para Adão — observou outro deus. — Mas será que ele não teria esse destino mesmo sem comer da Árvore do Conhecimento do Bem e do Mal? Será que não ficará tentado, graças a seu desejo de crescer, a tomar o fogo da vida em suas próprias mãos, mesmo sem se iludir de que isso seja bom? / — Pode ser — concordaram os outros. / — Mas qual seria o resultado? Ele se tornaria um criminoso, um transgressor, um ladrão de vidas, um assassino das criaturas a seu redor. Sem a ilusão de que o que faz é bom, e logo deve ser feito a qualquer custo, ele logo se cansaria da vida de transgressor. De fato, isso deve acontecer durante sua busca pela Árvore da Vida. Mas, se ele provar de nossa árvore do conhecimento, então o cansaço não o atingirá. Então dirá: 'Que importa se estou farto de viver como o assassino de toda a vida que me cerca? Conheço o bem e o mal, e esse modo de viver é bom. Logo, devo viver assim, mesmo que esteja morto de cansaço, mesmo que destrua o mundo e até a mim mesmo. Os deuses escreveram no mundo uma lei dirigida a todos, mas que não pode se aplicar a mim, pois sou igual a eles. Sendo assim, viverei fora dessa lei e crescerei sem limites. Ser limitado é ruim. Roubarei o fogo da vida das mãos dos deuses e o armazenarei para o meu crescimento, e isso será bom. Destruirei as espécies que não servem a meu crescimento, e isso será bom. E, porque essas coisas são boas, deverão ser feitas a qualquer preço. Pode ser que eu destrua o jardim, que o deixe em ruínas. Pode ser que meus descendentes proliferem sobre a terra como gafanhotos, devastando-a até sufocarem em sua própria sujeira e não suportarem olhar um para o outro e enlouquecerem. Ainda assim deverão prosseguir, pois crescer sem limites é bom e aceitar os limites é ruim. E quem disser: ‘Deixemos o fardo dessa vida de crimes e voltemos a viver sob a proteção dos deuses’, deverá ser morto, pois o que diz é ruim. E quando, enfim, todo o jardim estiver submetido ao meu uso, e todas as espécies que não servem ao meu crescimento estiverem eliminadas, e todo o fogo da vida que houver no mundo alimentar minha prole, ainda assim continuarei a crescer. E hei de dizer aos povos vizinhos: ‘Crescei, pois isso é bom’, e eles crescerão . E, quando o povo desta terra não puder mais crescer, haverá de atacar o povo vizinho e dizimá-lo, para poder crescer ainda mais. E, se os gemidos de minha prole coarem pelo ar do mundo todo, haverei de dizer-lhes: ‘Deveis suportar o sofrimento, pois é pela causa do bem. Vede como nos tornamos grandes! Com o conhecimento do bem e do mal, fizemos de nós os senhores do mundo, e os deuses perderam o poder sobre nós. Ainda que seus gemidos encham o ar, não é mais doce viver em nossas próprias mãos do que nas mãos dos deuses?' . / E quando os deuses ouviram isso, viram que, dentre todas as árvores do jardim, apenas a Árvore do Conhecimento do Bem e do Mal poderia destruir Adão. E então lhe disseram: — Pode provar dos frutos de todas as árvores do jardim, exceto o da Árvore do Conhecimento do Bem e do Mal, pois, no dia em que dele provar, certamente perecerá. / (...) — Nenhuma delas [as três bíblias de Ismael] comenta o motivo por que a árvore era proibida a Adão. / — Esperava que comentassem? / — Bem... esperava. / — Os textos foram escritos pelos Pegadores, e essa história sempre foi um mistério insondável para eles. Nunca puderam imaginar por que o conhecimento do bem e do mal fora proibido ao homem. Não entende por quê? / — Não. / — Porque, para os Pegadores, esse conhecimento está acima de todos. É aquele que mais benefícios traria ao homem. Sendo assim, por que os deuses o teriam proibido? -- Daniel Quinn, Ismael, 1992.

❧ Rodolfo Llinás e seus colegas da Universidade de Nova York, comparando as propriedades eletrofisiológicas do cérebro na vigília e no sonho, postularam um único mecanismo fundamental para ambos - uma incessante comunicação interior entre córtex cerebral e tálamo, uma incessante interação de imagem e sentimento, independente de haver ou não alguma informação sensória. Quando há esse dado, a interação o integra para produzir a consciência desperta, mas na falta de dados sensórios ela continua a produzir estados cerebrais, aqueles estados que chamamos de fantasia, alucinação ou sonhos. Assim, a consciência desperta é sonho - só que sob a coerção da realidade exterior. -- Oliver Sacks, Um Antropólogo em Marte, 1995.

❧ Afirmam os dicionários que a testada é a parte de uma rua ou estrada que fica à frente de um prédio, e nada há de mais certo, mas também dizem, dizem-no pelo menos alguns, que varrer a sua testada significa afastar de si alguma responsabilidade ou culpa. Grande engano vosso, senhores filólogos e lexicólogos distraídos, varrer a sua testada começou por ser precisamente o que estão a fazer agora estas mulheres da capital, como no passado também o haviam feito, nas aldeias, as suas mães e avós, e não o faziam elas, como não o fazem estas, para afastar de si uma responsabilidade, mas para assumi-la. Possivelmente foi pela mesma razão que ao terceiro dia saíram à rua os trabalhadores da limpeza. Não traziam uniformes, vestiam à civil. Disseram que os uniformes é que estavam em greve, não eles. -- José Saramago, Ensaio Sobre a Lucidez, 2004.

❧ A poesia pode ser demasiadamente verdadeira. Pura como água destilada. Quando a verdade não é nada senão a verdade, ela é antinatural; uma abstração que com nada se parece do mundo real. Na natureza há sempre tantas coisas estranhas misturadas à verdade essencial! Eis porque a arte nos comove: precisamente porque está depurada de todas as impurezas da vida real. As orgias verdadeiras nunca são tão excitantes como os livros pornográficos. Num volume de Pierre Louys todas as raparigas são jovens e têm formas perfeitas; não há soluços de bebedeira, nem mau hálito, nem fadiga, nem tédio, nem lembranças súbitas de contas a pagar ou de cartas comerciais a responder; nada disso para interromper os arrebatamentos. A arte nos dá a sensação, o pensamento, o sentimento absolutamente puros; isto é: quimicamente puros. - E acrescentara, com uma risada: - Não moralmente. -- Aldous Huxley, Contraponto, 1928.

❧ À parte certas considerações superadas sobre mestiçagem, não há como discordar de Euclides da Cunha quando, fazendo expressa referência ao 'abandono em que jazeram' os nossos 'rudes patrícios dos sertões do Norte', conclui ser o sertanejo 'um retrógrado' e não 'um degenerado'. Realmente, é a imagem de um retrógrado que estamos pintando na tentativa de caracterização do homem sertanejo do Nordeste. Retrógrado porque envolto em toda uma estrutura familiar, política, econômica, moral e religiosa arcaica e arcaizante, fruto do isolamento de séculos. É conhecida a religiosidade medieval do sertanejo, capaz de facilmente resvalar em fanatismo. Também o são a sua rigidez em questões de família, o admirável sentido fiduciário das relações negociais, o conservadorismo político arraigado e o precioso classicismo vocabular, este último tantas vezes confundido por estudiosos apressados com o que seria um falar errado, quando na verdade se está diante do 'português do século XVI', do falar clássico de Camões e Gil Vicente, segundo demonstraram os estudos de Mário Marroquim, de Virgílio de Lemos, ou ainda, os de Câmara Cascudo. 'Enquistado durante séculos distanciado do litoral, onde se processava a mistura das culturas e a formação mental de cada geração, o sertanejo pôde conservar o fácies imperturbável, a sensibilidade própria, o indumento típico, o vocabulário teimoso, como usavam seus maiores', ensina este último, para acrescentar adiante, e no particular que estamos referindo, que o sertanejo assim condicionado 'manteve o idioma velho, rijo e sonoro, dos antigos colonizadores'. (...) É bem sintomático que nem mesmo os respingos do sal marinho das longas travessias da colonização, essa cultura retentiva e conservadora tenha conseguido bater de sobre as palavras trazidas pelo marujo cansado do mar, que resolveu um dia se internar sertão adentro. (...) [Ao contrário,] todos esses caracteres apresentam-se dotados de surpreendente contemporaneidade, por terem os fatores e circunstâncias que os produziram permanecido praticamente intocados até as duas primeiras décadas do século passado. (...) O palco primitivo em que se desenrolou o ciclo do gado nordestino esteve mesmo armado até ontem e, em parte, ainda está. -- Frederico Pernambucano de Mello, Guerreiros do Sol, 1985.

❧ O ser humano é o ponto de chegada de um longuíssimo processo evolutivo - histórico -, através do qual o Cosmos adquire consciência. O homem, filho, neto, bisneto, tataraneto do Cosmos, é o olho translúcido dele - consciência acordada. A descoberta disso, e de que as coisas existem para doar-se, em sua graça, a uma consciência que as albergue, constitui, a meu ver, a essência do fenômeno religioso. Religar-se, reencontrar os fios que nos fazem pertinentes a tudo, a todos - eis a vocação da consciência. Ligados a todas as coisas, os homens, pelo trabalho, se comunicam, estendem uns para os outros suas mãos, seus músculos, seus corpos. O mundo é um mosaico, um tapete, as cidades, as culturas - tudo são produtos da práxis humana, que irmana aqueles que os produzem. O presente e vigente sistema social é que separa, atomiza, isola, coisifica, aliena. O fetichismo da mercadoria - a idolatria do bezerro de ouro - castra no homem a sua dimensão fraterna, que o torna, por vocação primígena, ligado - e religado. (...) Não há sujeito em si mesmo fundado, o sujeito existe por mediação do objeto a que ele se patenteia, sujeito e objeto são mera terminologia, recurso heurístico para distinguir o que em si mesmo é unidade: comunicação, unidade entre o Eu e o Tu, na mutualidade do Nós. Fundamos um Nós com tudo o que existe. Esta descoberta é a essência do fenômeno religioso. A religiosidade não tem a ver, necessariamente, com a idéia de Deus. Religar-se é desvendar o rosto do Outro - o rosto do mundo. -- Hélio Pellegrino, Carta (comovida) a uma Jovem, em Nancy Mangabeira Unger, O Encantamento do Humano, 1991.

❧ Ouça isto: o ser humano é um complicado processo bioquímico que, na melhor das hipóteses, dura por volta de oitenta ou noventa anos, e que no sentido mais profundo não passa do enganoso âmbito da luta de algumas macromoléculas para se multiplicar. O único fim que se pode atribuir à vida humana é o que tem lugar dentro de cada uma das células, isto é, a auto-reprodução em massa dos genes. Pois um 'ser humano' não passa da máquina de sobrevivência dos genes. A finalidade em si é o gene, não o organismo. Então, a finalidade da existência é a sobrevivência dos genes, e não o que estes dirigem. A meta é o ovo, e não a galinha, porque a galinha nada mais é que um produto do ovo. Por isso podemos encerrá-las numa gaiola! - Você parece um pouco exaltado. Mas vou deixar passar o que acaba de dizer e tomá-lo como um resumo aceitável. - Não deveria. Daqui a cinquenta anos a maior parte dos seres humanos rirá de uma visão do mundo como esta. Pertencemos a uma geração de biólogos que comete coletivamente um reductio ad absurdum. -- Jostein Gaarder, Maya, 1999.

❧ Como La Loba, nós quase sempre começamos num deserto. Temos uma sensação de perda de direitos, de alienação, de não estarmos vinculadas nem mesmo a uma moita de cactos. Os antigos chamavam o deserto de lugar da revelação divina. Para as mulheres, porém, ele oferece muito mais que isso. O deserto é um lugar em que a vida se apresenta muito condensada. As raízes das plantas se agarram à última gota d'água, e as flores armazenam umidade abrindo apenas de manhã cedo e ao final da tarde. A vida no deserto é pequena porém brilhante, e quase tudo que acontece tem lugar no subsolo. Essa descrição é semelhante à vida de muitas mulheres. O deserto não é exuberante como uma floresta ou a selva. Ele é muito intenso e misterioso nas suas formas de vida. Muitas de nós vivem vidas desérticas: ínfimas na superfície e imensas por baixo. -- Clarissa Pinkola Estés, Mulheres Que Correm Com Lobos, 1992.

❧ Havia no ígneo fantasma uma perfeição que tornava também perfeito o selvagem deleite - e isso justamente porque a visão estava fora do meu alcance, com nenhuma possibilidade de obtenção a estragá-lo devido a consciência de um tabu adicional; com efeito, pode ser que a mesma atração que a imaturidade exerce sobre mim resida não tanto na limpidez de uma pura, clara e proibida beleza de criança, como na certeza de uma situação em que infinitas perfeições preencham a lacuna entre o pouco que é dado e o muito que é prometido - a grande rosa cinzenta que jamais será obtida. Mes fenêtres! Pairando acima do manchado pôr-do-sol e da noite que se aproximava, eu, a ranger os dentes, reunia todos os demônios do meu desejode encontro às grades de um balcão palpitante - um balcão pronto para decolar na noite negra e úmida, de damasco... e decolava. E, logo após, a imagem iluminada se movia e Eva tornava a ser uma costela e não havia nada na janela senão um homem gordo, parcialmente vestido, lendo o jornal. -- Vladimir Nabokov, Lolita, 1955.

❧ Nos arredores da cidade do Coire, houve uma irrupção súbita de larvas de cabeça negra, corpo branco, da grossura do dedo mindinho, movendo-se sobre seis patas e muito conhecidas dos lavradores: chamam-lhes, em linguajar alemão, Laubkafer, penetram na terra no começo do inverno, atacam as raízes, ferrando nelas um dente mortífero, de tal modo que, no regresso do bom tempo, as plantas, longe de rebentarem, secam. (...) Ora, os habitantes citaram esses insectos destruidores perante o tribunal provincial, através de três editais consecutivos; constituíram-lhes um advogado e um procurador, observando as formalidades da justiça e procederam depois contra eles com todas as formalidades requeridas. Finalmente, o juiz, considerando que as ditas larvas eram criaturas de Deus, que tinham direito de viver, que seria injusto privá-las de subsistência, relegou-as para uma região florestal e selvagem, a fim de que deixassem de ter pretexto para devastar as terras de cultivo. E assim foi feito. -- Hemmerlein, 1497 citado por Paula Castro, Natureza, Ciência e Retórica na Construção Social da Ideia de Ambiente, 2005.

❧ Só a natureza é divina, e ela não é divina... / Se falo dela como de um ente / É que para falar dela preciso usar da linguagem dos homens / Que dá personalidade às coisas, / E impõe nome às coisas. / Mas as coisas não têm nome nem personalidade: / Existem, e o céu é grande, a terra larga, / E o nosso coração do tamanho de um punho fechado... / Bendito seja eu por tudo quanto sei. / Gozo tudo isso como quem sabe que há o sol -- Fernando Pessoa, O Guardador de Rebanhos, XXVII, 1925, de Poemas Completos de Alberto Caeiro.

❧ A cara de Abel estava coberta de moscas, havia moscas nos seus olhos abertos, moscas na comissura dos lábios, moscas nas feridas que tinha sofrido nas mãos quando as levantara para proteger-se dos golpes. Pobre Abel, a quem deus tinha enganado. O senhor havia feito uma péssima escolha para a inauguração do jardim do éden, no jogo da roleta posto a correr todos tinham perdido, no tiro ao alvo de cegos ninguém havia acertado. A eva e adão ainda restava a possibilidade de gerarem um filho para compensar a perda do assassinado, mas bem triste há de ser a gente sem outra finalidade na vida que a de fazer filhos sem saber porquê nem para quê. Para continuar a espécie, dizem aqueles que crêem num objectivo final, numa razão última, embora não tenham nenhuma ideia sobre quais sejam e que nunca se perguntaram em nome de quê terá a espécie de continuar como se fosse ela a única e derradeira esperança do universo. Ao matar Abel por não poder matar o senhor, Caim deu já a sua resposta. Não se augure nada bom da vida futura deste homem. -- José Saramago, Caim, 2009.

❧ Encontramos mais túmulos e mais ruínas. Havia dois ou três monumentos fúnebres ao lado da estrada. Segundo o costume circassiano, ali são enterrados seus cavaleiros. Uma inscrição tártara, uma imagem de um sabre e uma marca talhada na pedra é tudo o que foi deixado para os netos ferozes em memória de seus ferozes antepassados./ Os circassianos nos odeiam. Nós os retiramos de suas vastas pastagens; seus aúles foram destruídos, tribos inteiras exterminadas. Eles se embrenham cada vez mais nas montanhas e de lá orientam suas incursões. A amizade dos circassianos pacificados é pouco confiável: estão sempre prontos a ajudar seus compatriotas rebeldes. Seu espírito de cavalaria selvagem decaiu visivelmente. Raras vezes atacam os cossacos em mesmo número, nunca a infantaria e correm ao ver um canhão. Em compensação, nunca deixam passar uma oportunidade de atacar um destacamento fraco ou uma pessoa indefesa. Esses lados de cá são cheios de boatos a respeito de seus crimes. Quase não há forma de pacificá-los enquanto não forem desarmados como fizeram com os tártaros da Crimeia, algo extraordinariamente difícil de executar em razão do predomínio de conflitos hereditários e vinganças de sangue entre eles. A adaga e o sabre são como partes do corpo, e os bebês começam a manejá-os antes de começar a balbuciar. Para eles, um assassinato é apenas um movimento do corpo. Mantêm seus prisioneiros na esperança de conseguir um resgate, mas os tratam de forma extremamente desumana, obrigam-nos a trabalhar acima de suas forças, alimentam-nos com massa crua, batem quando têm vontade e colocam para vigiá-los seus meninos, que, por qualquer palavra, têm o direito de matar o refém com seus sabres infantis. Recentemente, capturaram um circassiano pacificado que atirara em um soldado. Ele se defendeu dizendo que sua espingarda estava carregada há tempo demais. O que fazer com um povo desses? No entanto, é preciso ter esperanças de que a conquista da parte leste do Mar Negro, ao cortar o comércio dos circassianos com a Turquia, obrigue-os a aproximar-se de nós. A influência do luxo pode favorecer sua domesticação: o samovar seria uma inovação importante. Há um meio mais forte, mais moral, mais de acordo com nosso século ilustrado: a pregação do Evangelho. Os circassianos adotaram a fé maometana há pouquíssimo tempo. Ficaram entusiasmados com o fanatismo enérgico dos apóstolos do Corão, dentre os quais se destacava Mansur, homem extraordinário que por muito tempo incitou o Cáucaso a revoltar-se contra o domínio russo, foi por fim capturado por nós e morreu no Monastério Soloviétski. O Cáucaso está à espera de missionários cristãos. Mas é mais fácil para nossa preguiça despejar letras mortas ao invés da palavra viva e mandar livros mudos à gente que não sabe ler. -- Aleksandr Púchkin, Viagem a Arzrum, 1836, em Bruno Barretto Gomide (org.), Nova Antologia do Conto Russo, 2011.

❧ A jornalista com importância coletiva diz que no mundo exterior as pessoas precisam acreditar em alguma coisa. Chamam isso de sagrado. É algo para ocupar um vazio, diz. O homem sem importância coletiva acha que acreditar é questão de tempo e não de espaço. Portanto, é estranho falar em vazio, como se acreditar fosse um lugar. Acreditar parece um estado. Algo sem substância, mais parecido com o tempo. -- Daniela Lima, Sem Importância Coletiva, 2014.

❧ Um dia, fui com amigos fazer um passeio de barco. Começou a chover; algumas pessoas procuraram abrigo dentro do barco e outros continuaram ao ar livre. A chuva, que começou pequena, se transformou rapidamente numa forte chuva tropical. Mesmo querendo, não teria sido mais possível voltar para o interior do barco; o jeito era permanecermos no aberto. Passado aquele primeiro momento de dúvida e de tremor, fui me adaptando à situação, me abrindo àquela realidade. A água vinha do céu, nos lavando, dando vida àquela floresta em volta, e todos nós. Quando cessou a chuva, o motor foi desligado, e o barco deslizou docemente seguindo a correnteza. Contemplando o rio, percebi o aparecer do arco-íris no céu, se refletindo nas águas límpidas. Nesse momento pude compreender que esta é a vocação da consciência: pela limpidez, pela transparência, refletir o céu, refletir o arco-íris. Ser esta possibilidade translúcida de ampliar o Universo. Nesse sentido, de certa forma o erro de Narciso foi um erro de inversão. Não compreendeu que ele mesmo deveria ser o lago para refletir outros lagos. Esta metáfora do lago é mais rica que a metáfora do espelho, até porque o lago aporta a quem ela reflete também a sua própria coloração: seus peixes, suas algas, seus tesouros. -- Nancy Mangabeira Unger, O Encantamento do Humano, 1991.

❧ Bem ali, no local mais fedorento de todo o reino, foi que nasceu Jean-Baptiste Grenouille, a 17 de julho de 1738. Era um dos dias mais quentes do ano. O calor pairava como chumbo por sobre o cemitério e empurrava para as ruas vizinhas os gases da putrefação que cheiravam a uma mistura de melões podres e chifre queimado. Quando as dores começaram, a mãe de Grenouille estava numa peixaria da Rue aux Fers e escamava pescadas que acabara de eviscerar. Os peixes, supostamente recolhidos do Sena naquela manhã, já fediam tanto que o seu fedor se sobrepunha ao dos cadáveres. Mas a mãe de Grenouille não sentia nem o cheiro dos peixes nem o cheiro dos cadáveres, pois o seu nariz era praticamente insensível à odores e, além disso, doía-lhe o corpo, e a dor tirava-lhe toda sensibilidade para sensações externas. Ela só queria uma coisa: que a dor cessasse, fazendo-a deixar para trás o quanto antes o horror do parto. Era o seu quinto filho. Os quatro anteriores ela havia despachado ali na peixaria, e os quatro haviam nascido mortos ou semimortos, pois a carne ensanguentada que dela saíra não se diferenciava muito das vísceras dos peixes que já estavam atiradas pelo chão, e também não vivera por muito tempo mais, e à noite era tudo jogado junto em carretas e levado para o cemitério ou lá para baixo no rio. Assim deveria ocorrer também hoje. A mãe de Grenouille era uma mulher ainda jovem, na casa dos 20 anos, ainda bonita, com quase todos os dentes na boca, um resto de cabelo e que, além de gota, de sífilis e de uma leve tísica, não tinha nenhuma doença grave; esperava ainda viver muito tempo, talvez uns cinco ou dez anos, e até talvez um dia casar e ter filhos de verdade, como a honrada esposa de um artesão viúvo ou coisa parecida... / A mãe de Grenouille queria que tudo já tivesse acabado. E quando as dores se tornaram mais intensas, ela se acocorou debaixo da mesa de limpar peixe e lá pariu, como já havia feito das quatro outras vezes, e cortou com a faca de peixe o cordão umbilical dessa coisa recém-nascida. -- Patrick Süskind, O Perfume, 1985.

❧ Assim, estranhamente, nossas almas são construídas, e por tais delicados ligamentos somos compelidos à prosperidade ou à ruína. Quando olho para trás, parece-me que essa mudança quase milagrosa de inclinação e de vontade representou uma sugestão imediata do anjo da guarda de minha vida - o último esforço empreendido pelo espírito de preservação a fim de evitar a tempestade que estava, já nessa ocasião, suspensa nas estrelas e pronta para me envolver. Sua vitória foi anunciada por uma tranquilidade incomum e uma alegria d'alma que se seguiram ao abandono de meus antigos e tormentosos estudos. Assim, estava-me sendo ensinado a associar o mal ao prosseguimento deles e a felicidade à sua negligência. / Foi um grande esforço do espírito do bem, embora ineficaz. O destino era muito poderoso e suas leis imutáveis haviam decretado minha absoluta e terrível destruição. -- Mary Shelley, Frankenstein, 1831.

mar 3 2016 ∞
oct 26 2017 +