Vovô, no último Domingo (14/04) eu fui pela primeira vez, desde sua ida, até a casa que você costumava viver. Eu vou admitir: foi estranho. Estranho entrar na sala e não te ver e mais estranho ainda te procurar no quarto e nem sua cama estar mais no cômodo. Cada um lida com o luto de sua forma. A avó simplesmente saiu do quarto de vocês dois pelo fato de não conseguir dormir onde o senhor não está mais.
Então eu e sua neta mais nova, a Rebequinha, decidimos que nós duas deveríamos fazer o trabalho de tirar suas roupas para doação. Ninguém tinha coragem, seus filhos talvez, mas não queriam naquele momento. Foi difícil, eu admito. Uma das coisas mais difíceis que já fiz em toda minha vida. Há cada peça de roupa doía mais ainda. O seu suéter tão conhecido por mim; as blusas tão velhinhas, mas que o senhor usava sempre. As roupas que chorei abraçada tentando achar algum conforto que só vinha do senhor.
Eu e ela achamos uma bolsa de couro (algo que eu nunca tinha visto), com vários livros sobre mecânica, certificados de curso e um caderno. É incrível como este caderno - em especial - é tudo o que o senhor era. Fiquei encantada como tudo que o senhor aprendia era escrito naquele caderno, cujo acredito que exista desde 2006 ou menos. Frases jogadas no ar; como usar pronomes; exercícios química e física; a história dos dinossauros com as espécies. Eu sempre soube da sua fome de conhecimento, porém ver com meus próprios olhos foi algo encantador. Lembro de uma parte do caderno onde havia exercícios de caligrafia escritos M-I-L-E-N-A (o nome de minha prima mais velha), eu chorei pensando o quão o senhor era esforçado mesmo nunca tendo suporte da sua família para os estudos.
Por fim, decidi que queria algo seu para mim. Meus olhos foram imediatamente para o canivete suíço e uma capa com uma faca personalizada (as duas estavam juntas). Não pensei duas vezes para ter certeza que queria aquilo, principalmente o canivete, pois lembro-me de uma conversa que tivemos e o senhor comentará sobre o utensílio. "Para que você quis esse canivete velho e todo quebrado?" foi a pergunta meu pai, assim que entrei no carro. "Não vou usá-lo, é apenas para me lembrar dele" respondi. Talvez meu pai não entenda, mas eu sempre vou fazer de tudo para as suas memórias nunca morrerem, mesmo que eu tenha que ficar com esse canivete suíço até o fim da minha vida.
Eu te amo para sempre.