se o tradutor constrói pontes entre culturas, ele não deixa de instalar o posto do pedágio com a velha desculpa da manutenção. os teóricos da tradução são a lei da responsabilidade fiscal da cultura.
dialético é o nome filosófico da criança que cresceu sem nunca ter aceitado "porque sim" como resposta.
a dialética é uma maneira de matar a morte, uma máquina de não morrer. ela pressupõe, com isso, a aceitação do preço de que tudo será tingido pelo risco da morte, sem o qual a vida já seria a morte.
o empirismo inglês está inscrito na sua língua: ele pergunta pela referência ("what do you mean?") enquanto o latino pergunta pela significação ("o que significa?") ou, diretamente, pelo desejo ("o que quer dizer?").
quando o ouvinte desatento pergunta: "afinal de contas, o que você quer dizer?", a língua portuguesa o obriga a admitir que sua escuta está orientada pelo balanço de rendimentos.
"eu não acredito em verdades absolutas" — quem faz esse gesto conquista a dupla vantagem de parecer democrático enquanto se reserva o direito de fechar os ouvidos para o que tenham a lhe dizer; se beneficia sem ônus do sentido pior do conceito de absoluto, a soberania de desprezar o outro ali onde ele afeta. por isso é mais efetivo que gritar "fora da minha propriedade!" assim, os diletantes conquistaram as cadeiras que lhes adornam de especialistas, o que, no debate público, tacitamente desliza de modo oportuno para junto do estimado em-si indizível. inevitavelmente perderá em seu próprio jogo para os desonestos que, mais honestamente, quebrarem tal regra, pois o jogo da desautorização é sem regras por definição. e, quando for arrastado pelas ruas acusado de mentor dos poderes secretos, gritará: totalitários!
só os passos maiores que a perna permitem tropeçar.
passado presente: o progresso da escuta regressiva