a contradição autografia/alografia é, para a música pop, um desenvolvimento da contradição música/letra. a fundação histórica da autografia musical se encontra nas gravações do revivalismo folk, mas ainda apenas "em si": a distância autográfica é meramente imposta pela precariedade técnica, mas é, desde então, recuperada esteticamente, de modo não intencional, como signo do caráter "originário" do gravado, da sua "autenticidade" da performance. a gravação é acionada exatamente contra a pouca espessura da notação alográfica das canções, que não preservam o "quê" originário. claro que os folcloristas sabem que aquelas canções são imitações de imitações, que subsistem diversas versões de uma mesma canção; mas ele entende que a performance gravada é uma expressão de uma essencialidade comum da vida orgânica tradicional. a gravação impõe, então, uma distância em relação a essa essencialidade, distância que redobra aquela que é própria do sujeito moderno alienado em relação a esse semblante de essencialidade da performance. phil spector desvela a autografia da gravação (como negação abstrata da alografia, como o "wall of sound" no qual a determinidade dos instrumentos se perde), com a qual a alografia da canção fica desessenciada e se trata não mais de fruir a distância inscrita na gravação da canção original, mas de fruir diretamente a pura superfície autográfica. é essa a "verdade" da qual brian wilson se aproxima demais: no smile, isso resulta simultaneamente em uma intensificação da autografização/fragmentação da alografia pela gravação modular à qual responderia a alografização via álbum conceitual, que reconstituiria o equilíbrio dos "dois mundos" ("heroes and villans" e sua dinâmica de rememoração da canção de martin williams como fundação da conquista do oeste, tentativa de totalizar a história americana). o fracasso que é resultado disso é a completa exterioridade entre os "feels" de ordenação não-necessária e os mitos que caem para fora deles; isso consolida que, em-si, a alografia é inessencial à autografia. daí a cisão entre o prog e o punk: enquanto aquele essencializa a alografia, este essencializa a autografia. mas o prog, com isso, cai para fora do conceito da música pop: afirma imediatamente a positividade da alografia, com a qual se restringe ao ecletismo da alografia exaurida pela tradição de concerto e pelo jazz. o punk até hardcore e o no wave, por outro lado, faz a autografização absoluta da alografia, o grau zero do único acorde e do vocal amelódico (talvez o ápice seja glenn branca?). nesse momento, a autografização absoluta cai como carente-de-conteúdo, no que a virada para o gótico, o jangle — o quarteto de rock como dispositivo de purificação do baroque pop dos anos 60, daí a repetição como relíquia: o retorno à casa como revelação de que não havia casa —, o grunge e, por fim, o shoegaze, que são modos de reincorporar a diferença qualitativa na autografia. o my bloody valentine conclui esse percurso.