uma análise do poema de baudelaire poderia mostrar em que a estética de hegel foi ultrapassada

Viens-tu du ciel profond ou sors-tu de l'abîme, O Beauté? ton regard, infernal et divin, Verse confusément le bienfait et le crime, Et l'on peut pour cela te comparer au vin.

há nessa estrofe um curioso procedimento em que o conceito do belo, personificado simbolicamente como destinatário, é desenvolvido por duas incidências da metáfora do céu/terra, cujo significado universal é então explicitado como a antítese entre o bem e o mal como práticas humanas (este o conteúdo contraditório do belo) apenas para ser novamente sintetizado pelo símile lírica com o vinho. na imagem do vinho, desde sua fruição imediata, seus usos simbólicos e sua produção histórica, a coincidência imediata do aprazimento sensível com o significado espiritual está entretecida profundamente e poderia ser encontrada de muitos modos. tal coincidência é aquela que hegel denominou de 'sinn', que seria o modo de apreensão mais elevado do belo natural. mas tal apreensão 'sinnvoll' está aqui voltada a um objeto que expele de si toda significação natural no sentido do que não é humanamente elaborado, admite apenas significações 'espirituais'; e, quanto a isso, os significados antitéticos da civilização e da decadência. esta não aparece aqui como queda para a natureza, mas como excesso de espírito. o próprio movimento formal da estrofe — personificação alegórica > metáfora > conceito abstrato > símile lírica — parece imitar a progressão da natureza para civilização e, então, para seu depois ainda indeterminado. disso já podemos entrever o conceito adorniano de natureza como o recalcado, aquilo cujo em-si proto-histórico está deformado e não pode se expressar conceitualmente. o uso desse símile lírico final, por si mesmo, contradiz a teoria hegeliana dos símiles; em primeiro lugar, porque uma apreensão clara do significado universal para além do sentimento deveria saciar o espírito, não impulsioná-lo novamente para o sensível. contra esse argumento, se poderia objetar que aqui o significado ainda é abstrato e a contradição aparece como contraposição abstrata. mas, em segundo lugar, o símile do vinho contradiz as indicações de hegel sobre o símile lírico, nas quais a riqueza de conteúdo do símile é diretamente proporcional à avidez com que o ânimo o deseja, isto é, a relação ao objeto do símile é mais teórica e menos prática; aqui, no entanto, temos a maior riqueza de significado associada à avidez mais extrema. fica claro, com isso, que não se trata aqui de uma desistência regressiva do espírito de resolver conceitualmente tal contradição que o leva à recaída no sensível, mas de uma apreensão clara da "confusion" objetiva, que, por isso, só pode ser expressa como imagem.

Tu contiens dans ton oeil le couchant et l'aurore; Tu répands des parfums comme un soir orageux; Tes baisers sont un philtre et ta bouche une amphore Qui font le héros lâche et l'enfant courageux.

Sors-tu du gouffre noir ou descends-tu des astres? Le Destin charmé suit tes jupons comme un chien; Tu sèmes au hasard la joie et les désastres, Et tu gouvernes tout et ne réponds de rien.

Tu marches sur des morts, Beauté, dont tu te moques; De tes bijoux l'Horreur n'est pas le moins charmant, Et le Meurtre, parmi tes plus chères breloques, Sur ton ventre orgueilleux danse amoureusement.

L'éphémère ébloui vole vers toi, chandelle, Crépite, flambe et dit: Bénissons ce flambeau! L'amoureux pantelant incliné sur sa belle A l'air d'un moribond caressant son tombeau.

Que tu viennes du ciel ou de l'enfer, qu'importe, Ô Beauté! monstre énorme, effrayant, ingénu! Si ton oeil, ton souris, ton pied, m'ouvrent la porte D'un Infini que j'aime et n'ai jamais connu?

o infinito sensível aparece como superior ao proporcionável pelo conhecimento

De Satan ou de Dieu, qu'importe? Ange ou Sirène, Qu'importe, si tu rends, — fée aux yeux de velours, Rythme, parfum, lueur, ô mon unique reine! — L'univers moins hideux et les instants moins lourds?

jan 19 2022 ∞
jan 19 2022 +