No texto central de sua obra, o Ideologia e Aparelhos Ideológicos de Estado, encontramos exatamente a tese de que a Ideologia, que não é nada além de forma, a "representação da relação imaginária dos indivíduos com suas condições de existência", é eterna, trans-histórica, universal e, desse modo, é na sua análise que se encontra a verdadeira realidade. Essa representação é necessariamente imaginária porque não existe nenhuma relação natural, sempre já dada, entre os indivíduos e suas condições de existência, ou seja, a atitude humana frente ao mundo não é dada deterministicamente, mas é mantida ideologicamente. Por isso fazer a crítica da Ideologia não é simplesmente mostrar que um modo de existência é "falso", "mentiroso" diante de um outro que seria "verdadeiro", "imparcial", "natural", "essencial" no sentido idealista. A crítica da Ideologia mostra exatamente que falta, na realidade humana, uma natureza, um referencial transcendente que a defina, um "conteúdo" pra além das "formas" em que esse conteúdo está disposto em uma existência historicamente específica. É, assim, o desenvolvimento teórico da tese de que que "a essência humana não é uma abstração inerente a cada indivíduo. Na sua realidade ela é o conjunto das relações sociais." É precisamente essa falta constitutiva, universal, que orienta e, assim sendo, põe em movimento a realidade humana por meio de suas contradições.

Aí reside também a crítica de Althusser à categoria de "alienação" no Jovem Marx (e também os limites dessa crítica). O que o francês pretende com ela é afirmar que não existe uma essência humana mítica da qual o trabalhador é alienado e à qual deve retornar.

Isso é verdade, no entanto, mesmo que no lugar em que miticamente se coloca essa essência primordial haja um vazio, o sujeito humano, para se constituir enquanto tal, precisa se colocar imaginariamente como um ente autônomo, inteiro, e, portanto, se alienar do seu caráter fundamental que é ser faltante. Por isso acho necessário ler Althusser com Lacan. A desalienação não é, dessa forma, um processo finito de retorno a uma origem perdida, mas um processo infinito de construção do próprio caminho a partir da constituição mítica desse objeto que é causa do desejo.

Isto posto em termos marxianos: o trabalho alienado é resultado de uma atividade produtiva que se volta à valorização do valor como um fim em si e que, portanto, se desconecta do caráter fundamental do trabalho, que, como define Marx, é a produção de valores de uso, ou seja, uma atividade orientada para suprir as necessidades humanas. Sua desalienação é, nesse sentido, a socialização dos meios de produção e a orientação da produção social pelos próprios trabalhadores a fim de produzir de acordo com suas necessidades.

jan 31 2017 ∞
jan 31 2017 +