por mais importante que seja a crítica hegeliana ao infinito ruim, ela derrota o seu propósito ao nomeá-lo opositivamente, como se daí imediatamente se desprendesse o outro, se não substancialmente, ao menos no nome. o problema da conversão da negação da negação em positividade não é senão esse. a nomeação não é senão a positivação de uma designação — no fim das contas, a estereotipação de uma experiência com o coisal, que, no entanto, é correlata da banalização imanente à entificação do coisal. mas se a ideia da infinitude já não está morta, ela depende de que o pensamento suporte dentro de si a tensão irresolvida entre o ente enquanto ente e o aspecto coisal, o heterogêneo, sem a qual o ente ou a coisa colapsam como outras palavras para a mercadoria. corolário inescapável disso é o compromisso em denunciar a falsidade de toda nomeação da infinitude, inclusive nesta sua substantivação — que é, aliás, o fundamento do jogo de palavras pelo qual hegel reapresenta como saída da essensialidade abstrata a essencialização abstrata do momento do ser-para-si. e é de suma importância que esse compromisso seja contra a falsidade das nomeações, e não algum pacto ocultista ao redor da interdição de um nome — essa é a diferença da dialética em relação à teologia negativa: afinal, a proibição de usar o nome de deus em vão implica que o nome de deus já está dado para todos. não se trata da mera proibição de fazer mais um giro dialético e tentar apreender reflexivamente essa própria ausência de nome, mas da constatação de que já não há nesse gesto qualquer dialética: se determinassemos positivamente o estar na infinitude como o denunciar constante dos nomes da finitude, já aí recaímos nela, pois o próprio procedimento pelo qual o finito é apresentado como categoria prévia, como se o finito já trouxesse seu nome na testa, automatiza a pretensa superação, já a transforma no finito. por isso, o espírito absoluto hegeliano termina sendo um ente entre outros. esse enredamento não é nenhum beco sem saída para a dialética, ao contrário, é um caso da sua mais característica sinalização do caminho pelo fracasso. quem o trata como ponto terminal do pensamento já não responde mais às demandas imanentes do objeto, está colonizado pela expectativa de totalização que justamente aí se revela extrínseca à razão. nesse ponto, a dialética emerge como orientação pragmática dizendo: mude de assunto. por isso, longe de isso implicar uma desistência da determinação, essa é a condição na qual a atividade diferenciadora ainda pode ser produtiva. com respeito a isso, até adorno por vezes é blochiano de modo problemático. dentre as muitas razões pelas quais é preciso se desvencilhar logo da fraseologia da filosofia 'pura' não é a menor a de que ela parece demandar ou a aceitação completa do presente ou um 'ainda não' que introduza um predicado de que já disponhamos. a própria problemática pressupõe escapismo, e tanto o 'amor fati' quanto o 'princípio esperança' fracassam porque quem anuncia que 'afirma a vida' já afirma mais essa própria afirmação que qualquer outra coisa. a questão sobre se a ação política deve se orientar ou não pela construção de uma 'universalidade por vir', por exemplo, só pode ser colocada de modo abstrato, como se esse jogo de termos abstratos pudesse produzir alguma oriantação significativa para quem está imerso em situações políticas concretas. e quando algo do tipo é levantado no interior das situações políticas, algo frequente em espaços políticos em inanição, é o momento de ser inescrupulosamente leninista e pedir falas encaminhativas. o ponto de colapso do pensamento não pode ser acolchoado com a certeza prévia de que ele é a tradução subjetiva de um novo já dado em si. se o concedêssemos, estaríamos de acordo com bergson. o problema deste não é exatamente que aquilo que ele entende pelo intuído se reduza à negação simples pela qual se dá sua expressão; é que tudo que se alcança com a sua linguagem evocativa, com qual ele sustenta a miragem de um intuído já presente em toda sua obviedade, não é senão a redução apriorística de toda experiência possível de abertura ao impredicado à categoria tediosa da 'intuição interna'. no seu pior aspecto, é a justificação dos versos de chico: "mesmo quando as minhas mãos estão ocupadas / em torturar, esganar, trucidar / meu coração fecha os olhos e sinceramente chora". e, no máximo, é uma desculpa esfarrapada para não escrever um bom poema.

dec 29 2020 ∞
dec 29 2020 +