• "Muito se pode proclamar da vantagem das regras, tanto quanto se diz em louvor da sociedade. O homem que se formar segundo aquelas nunca há de criar uma coisa verdadeiramente insulsa ou ruim, como o que obedecer às convenções sociais jamais será um péssimo vizinho ou celerado. Contudo, digam o que disserem, a regra prejudica e perturba o sentimento da natureza e sua verdadeira manifestação." (página 55)
  • "Oh! A distância é tal qual o futuro! Um como universo envolto em sombras está em frente a nós, e as nossas sensações como os nossos olhares se esvaem nele, e ansiamos entregar-nos de corpo e alma, e com todo o coração nos absorvemos num único e magnífico sentimento. Mas, ah! quando acorremos, quando se torna próximo o longínquo, tudo volta a ser como antes, e em nossa triste inópia e limitação a alma suspira pela vaga aspiração que lhe fugiu. / Assim o mais inquieto vagabundo acaba por sentir nostalgias da pátria, e encontra em sua cabana, nos braços da esposa e dos filhinhos, e na atividade necessária para os manter a todos, as delícias que procurara em vão percorrendo o universo." (p. 70)
  • "Se, ao menos, todos os dias, cada um de nós a si mesmo dissesse: só farás ao teu amigo o que lhe não possa perturbar a alegria, e seja próprio para lhe ampliar a felicidade, que participarás com ele. A tua mais suave obrigação é dar lenitivo à sua alma se a tortura alguma angústia, e a corrói uma tristeza. / E quando a mais inexorável, a mais cruel enfermidade se abater sobre a criatura cujos dias floridos dissipaste, e ela jazer, exânime, fitando o céu com o olhar quase sem vista, o gelado suor lhe as têmporas gelando, então, como um sicário condenado, trespassado do horrível sentimento de que é tarde demais, e tu nem sequer não consegues, embora a troco de tudo o que possuis e podes, insuflar-lhe uma partícula de vigor, uma gota de energia, hás de sentir as câimbras angustiosas do remorso dentro das entranhas." (p. 76)
  • "Vós, homens [...], quando falais de alguma coisa, precisais acrescentar: isso é inepto, é hábil, é bom, é mau. Que significa isto? Haveis com tais palavras investigado as relações internas de uma coisa? Sabeis por isso definir exatamente as causas determinantes da consumação do ato, e explicar por que ele se realizou, e por que tinha de se realizar? Se conhecêsseis as tais causas não seríeis tão precipitados em vossos julgamentos." (p. 90)
  • "Ah! homens sensatos! [...] Paixão! ebriedade! vesânia! Vós vos conservais tão distantes, tão indiferentes, tão alheios a tudo, vós, homens morigerados e moralizadores. Censurais o ébrio, abominais o insensato, e seguis vossa sêmita, como um antiste, e como os fariseus agradeceis a Deus porque Ele vos fez diferente desses infelizes. / Mais de uma vez me embriaguei, e as minhas paixões não distaram muito da loucura, e de ambas essas coisas não me quero arrepender. Aprendi por mim próprio como todos os homens transordinários, os que realizam algo sublime ou que parecia impossível, foram sempre taxados de loucos ou de violentos. / Também na vida comum e corriqueira é insuportável ouvir-se ante uma ação nobre, generosa e inesperada: esse homem é ébrio, é um demente. Envergonhai-vos vós, que sois sóbrios e sensatos!" (p. 91)
dec 29 2014 ∞
nov 4 2015 +