- "Porque, para mim, pessoas mesmo são os loucos, os que estão loucos para viver, loucos para falar, loucos para serem salvos, que querem tudo ao mesmo tempo, aqueles que nunca bocejam e jamais dizem coisas comuns mas queimam, queimam, queimam, como fabulosos fogos de artifício explodindo como constelações e, cujo centro fervilhante -pop- pode-se ver um brilho azul e intenso até que todos "aaaaaaah!".
- ""Te vejo em Nova Iorque, Terry", disse. Estava combinado que dentro de um mês ela se dirigiria para Nova Iorque junto com seu irmão. Ambos sabíamos que ela não o faria."
- "Oh, sim, saquem ele, tão meigo: justamente neste instante aquela mente está sendo cruzada por pensamentos que eu daria o último pedaço do meu braço para conhecer; penetrar profundamente nela e descobrir o que o pobre infeliz está pensando sobre os pratos de presunto com nabos que comerá esse ano."
- "Justamente nessa época algo estranho começava a me obcecar. Era o seguinte: eu me esquecera de alguma coisa. Uma decisão que estivera prestes a tomar pouco antes da aparição de Dean; e agora ela estava dirigindo-se claramente para fora da minha cabeça ainda que suspensa na ponta da língua da minha mente. Eu estalava os dedos, tentando relembrar do que se tratava. Não podia dizer se era uma decisão real ou só uma reflexão esquecida. Isso me amedrontava, me espantava, me deixava triste. Tinha algo a ver com o Viajante Encapuzado. Certa vez, Carlo Marx e eu nos sentamos frente a frente em duas cadeiras, joelho contra joelho, e eu lhe contei um sonho que tivera, com uma estranha figura árabe que me perseguia através do deserto; uma figura da qual eu tentava escapar mas que finalmente me alcançara pouco antes de chegar à Cidade Protetora. "Quem era?", perguntou Carlo. Refletimos. Sugeri que talvez fosse eu mesmo vestindo um manto. Não era isso. Algo, alguém, algum espírito nos perseguia, a todos nós, através do deserto da vida, e estava prestes a nos apanhar antes que alcançássemos o paraíso. Naturalmente, agora que reflito sobre isso, trata-se apenas da morte: a morte vai nos surpreender antes do paraíso. A única coisa pela qual ansiamos em nossos dias de vida, e que nos faz gemer e suspirar e nos submetermos a todos os dias de dóceis náuseas, é a lembrança de uma alegria perdida que provavelmente fora experimentada no útero e que somente poderá ser reproduzida (apesar de odiarmos admitir isso) na morte. Mas quem quer morrer?"
- "Ele (Dean) me fazia pensar que tudo estava prestes a acontecer - aquele momento em que você sabe tudo e tudo fica decidido, para a eternidade."
- "Enquanto corríamos tive uma louca visão de Dean correndo assim pela vida, seus braços trabalhando como pistões, suor escorrendo de sua fronte, suas pernas se contorcendo como as de Groucho Marx, sempre gritando 'Sim! Sim, cara, claro que você consegue me acompanhar!' Mas ninguém podia ser tão rápido quanto ele, essa é a verdade."
- "E por um instante alcancei o estágio do êxtase que sempre quis atingir, que é a passagem completa através do tempo cronológico num mergulhar em direções às sombras intemporais, e iluminação na completa desolação do reino mortal e a sensação de morte mordiscando meus calcanhares e me impelindo para a frente como um fantasma perseguindo seus próprios calcanhares, e eu mesmo correndo em busca de uma tábua de salvação de onde todos os anjos alçaram voo em direção ao vácuo sagrado do vazio primordial, o fulgor potente e inconcebível reluzindo na radiante Essência Mental, incontáveis terras-lótus desabrochando na mágica tepidez do céu. Eu podia ouvir um farfalhar indescritível que não estava apenas nos meus ouvidos mas em todos os lugares, e não tinha nada a ver com sons. Percebi ter morrido e renascido incontáveis vezes, mas simplesmente não me lembrava justamente por que as transições da vida para a morte e de volta à vida são tão fantasmagoricamente fáceis, uma ação mágica para o nada, como adormecer e despertar um milhão de vezes na profunda ignorância, e em completa naturalidade, compreendi que somente devido à estabilidade da Mente propriamente dita aconteciam essas ondulações de nascimento e morte como se fosse a ação do vento sobre um lençol de água pura, serena e espelhada. Senti uma satisfação completa, aquele gole de vinho que te traz um arrepio de satisfação num fim de tarde; meus pés se arrepiaram. Pensei que ia morrer naquele exato instante. Mas não morri."
- "Foi um momento sombrio. Estávamos pensando que nunca mais nos veríamos e não nos importávamos com isso."
- "O jovem lançador parecia Dean. Uma loira bonita na platéia parecia Marylou. Era a noite de Denver; tudo o que fiz foi morrer. Lá em Denver, lá em Denver. Tudo o que fiz foi morrer."
- "Com Dean, o frenético, eu apenas cruzava o mundo sem jamais conhecê-lo."
- "Aquele saxofonista realmente tinha AQUILO - e depois de consegui-lo, soube conservá-lo. (...) Bem, ali está uma música e aqui está a plateia, certo? A função dele é deixar rolar aquilo que todos estão esperando. Ele começa com os primeiros acordes, então delineia seu plano de ação musical, o público 'yeah yeah', percebe tudo, então ele se ilumina e tem que tocar com energia à altura daquilo que esperam de seu destino. De repente, durante um refrão, ele consegue AQUILO, - todos que o observam percebem, escutam; ele segura, vai em frente e o tempo para. Ele preenche o espaço vazio com a substância das nossas vidas; são confissões vindas do âmago de sua barriga, lembranças e ideias revividas com o clamor de melodias esquecidas. Ele poderia tocar e tocar , cruzando todas as pontes e retornar com um sentimento tão infinito, explorando as profundezas da alma, porque não é a melodia do momento, e que todos conhecem, o que conta, mas AQUILO!"
- "'Sal, Sal, olha, foi lá que nasci, pensa nisso! As pessoas mudam, elas comem refeições ano após ano e se transformam, a cada jantar, a cada almoço. Hi, olha só.' Ficou tão excitado que me fez chorar. Aonde tudo isso conduziria? (...) Até que vislumbramos mais uma vez a imensa e calorenta planície de Denver - e Dean estava em casa. Foi com uma expressão estúpida de suspiro aliviado que aquele caras nos largaram na esquina da 27ª com a Federal. Nossa sofrida bagagem estava ali, amontoada mais uma vez na beira da calçada; tínhamos um percurso muito maior pela frente. Mas estava tudo bem, a estrada é a vida."
- "'Ei, garoto, você consegue ma-ri-ju-ana?'"
- "Quando melhorei, vi que rato ele tinha sido, mas aí tive de ponderar a impossível complexidade da vida dele, a maneira por que fora forçado a me abandonar lá, doente, para retornar às suas esposas e espantos. Tudo bem, Dean, meu velho, não direi nada."
- "O velho Dean se foi, pensei, e disse alto e bom som: 'Tudo bem, isso não é problema para ele.' E lá fomos nós para o concerto triste e absurdo para o qual, é claro, eu não tinha estômago, e o tempo inteiro fiquei pensando em Dean e em como ele voltaria a pegar aquele trem e rodaria cinco mil quilômetros sobre aquela terra medonha e colossal sem jamais saber o motivo pelo qual viera, exceto para me ver."
- "Assim na América quando o sol se põe e eu sento no velho e arruinado cais do rio olhando os longos, longos céus acima de Nova Jersey e posso sentir toda aquela terra crua e rude se derramando numa única, inacreditável e elevada vastidão até a costa oeste, e toda aquela estrada seguindo em frente, todas as pessoas sonhando nessa imensidão, e em Iowa eu sei que agora as crianças devem estar chorando na terra onde deixam as crianças chorar, e você não sabe que Deus é a Ursa Maior? e a estrela do entardecer deve estar morrendo e irradiando sua pálida cintilância sobre a pradaria, reluzindo pela última vez antes da chegada da noite completa e abençoa a terra, escurece todos os rios, recobre os picos e oculta a última praia e ninguém, ninguém sabe o que vai acontecer a qualquer pessoa, além dos desamparados andrajos da velhice, eu penso então em Dean Moriarty, penso até no velho Dean Moriarty, o pai que jamais encontramos, eu penso em Dean Moriarty."
jun 23 2014 ∞
jan 12 2016 +